Por: Fernando Flecha
“Se você trabalha duro, você pode alcançar qualquer coisa”.
Essas belas palavras (também conhecida como a maior lorota de todos os tempos) são destiladas o tempo todo em nossa consciência coletiva. Já faz parte do nosso DNA, a boa e velha baboseira do sonho americano. Precisamos acreditar que o trabalho duro pode triunfar em todas as circunstâncias.
Mas que tal fazer você pirar o cabeção??? O que acontece se trabalharmos duro e não conseguirmos nosso objetivo? A implicação é que não trabalhamos duro o suficiente. Se a razão pela qual conseguimos é por causa do trabalho que colocamos, o oposto deve ser verdade. Se falhamos, é por nossa culpa, a nossa conduta não foi perfeita. Após o fracasso, voltamos para o quartel general, determinado a dobrar, quiçá triplicar o nível de esforço. Envolvidos sob a manta do trabalho árduo, aceleramos ainda mais, confortáveis em saber que, com nosso renovado espírito do trabalho árduo, agora, superaremos as dificuldades.
Quando estamos presos na mentalidade do trabalho árduo superando tudo, a resposta está sempre no trabalho.
Embora o sentimento seja nobre, se o aceitarmos, ocorre uma condição estranha. Nós nos tornamos escravos do trabalho, colocando-o antes de tudo.
Quantos de vocês experimentaram a ansiedade de completar 12,4km no treino ao invés dos 13km prescritos? Ou teve um desespero momentâneo porque o seu treinador (que é preocupado com vc mas vc o considera chato e cricri) mudou o treino da corrida de quarta-feira que seria um treino ultra difícil de pista para um trote maroto regenerativo. O alarme tocou alto dentro da sua cachola, preocupado que você esteja talvez “perdendo condicionamento” no prazo de tempo incrivelmente curto de alguns dias. Ou você simplesmente correu 1km a menos no treino de terça e talvez queira correr um a mais na sexta para compensar o “km perdido”.
Isto é o que se chama de Insegurança do trabalho duro. A necessidade de fazer algo, qualquer coisa, para sentir que está progredindo. É o que acontece quando os indivíduos perdem de vista o quadro geral (ou na verdade nem enxergam) e acreditam que o trabalho duro é o único ingrediente para o sucesso. Esquecendo que o bagulho é muito maior do que um km a mais ou a menos ou um kg a mais ou a menos quando se fala em desempenho.
Isso não quer dizer que trabalhar duro não deve ser celebrado, deve ser e muito. Como Percy Cerutty (também conhecido como técnico das antigas) declarou: “É a superação, e não o sucesso, que considero importante.” A magia está no trabalho; E isso tem que ser feito. No entanto, o trabalho também pode se tornar um estorvo, um atraso que nos impede de descobrir o que está errado ou por que não estamos conseguindo nossos objetivos. De muitas maneiras, ele pode evitar que os indivíduos atinjam seus objetivos.
Para essas pessoas aceleradas o desafio não é não fazer, e sim deixar de fazer em alguns momentos. Ter a confiança nas suas habilidades para entender o que precisa ser feito e fazer exatamente isso (Um bom técnico ajudaria e muito nisso, mas o ego e o Instagram não deixam a voz do técnico ser escutada). Ou como Fred Wilt tentou ensinar algo para seu pupilo (e futuro recordista mundial da maratona) antes de um treino mal feito que o deixou no estaleiro por alguns meses:
“Não posso dizer que se você fizesse feito o treino de acordo com que estava na planilha, você nesse momento estaria machucado. Esta é uma manifestação de incerteza. Há tempo para treinar e tempo para descansar – não meio descanso. Esta é uma lição amarga que você não aceitou. ”
CRÉU
Fonte: http://www.scienceofrunning.com/2017/10/the-insecurity-of-hard-work.html